2ª Vivência

Neste segundo encontro, temas como bordado, cantigas, algodão, fiação e tecelagem foram trabalhados com as Meninas de Sinhá e as Mulheres do Jequitinhonha.

As mulheres trocaram muitas experiências de vida em relação à semente do algodão e seus usos com as pessoas do Alto Vera Cruz e Vale do Jequitinhonha. As Mulheres do Jequitinhonha dividiram com as Meninas de Sinhá a sua prática de trabalho em relação à cadeia do algodão: do plantar ao descaroçar, bater (cardar), fiar no fuso e na roda, e por fim tecer.

Diário de Bordo - 2ª Vivência

Meninas de Sinhá
Alto Vera Cruz – BH
2, 3 e 4 de março de 2023

Tudo nasce, e renasce a cada encontro, com Valdete. “Quando o povo se une, as coisas acontecem”, lembram as Meninas de Sinhá. Elas mesmas, sementes e grande acontecimento. Lembrar de Valdete é também reconhecer que na memória estão nossos tesouros, os saberes que a vida nos traz e que construímos juntas. As Meninas de Sinhá, receberam pela primeira vez as Mulheres do Jequitinhonha, fiandeiras, tecelãs, bordadeiras, agricultoras, parteiras, raizeiras, mulheres que reacendem nelas as lembranças da vida na beira dos fogões de lenha, nos roçados, no colo da mãe.

A semente do algodão, tema deste primeiro encontro entre o Vale e o Alto Vera Cruz, não se dá por acaso. Quando Vivi visitou as casas das Meninas, viu ali no quintal de Seninha o primeiro pezinho de algodão, cheio de histórias. Depois, vieram outros quintais com algodoeiros e Vivi percebeu que a memória dos cuidados estava plantada naqueles quintais. Saberes transmitidos por gerações que ligavam aquelas mulheres às mulheres do Vale.

Durante três dias elas partilharam suas histórias de vida, trajetórias de esforço e, por vezes, sofrimento. Mas também a solidariedade tão presente entre elas e uma alteridade que resiste desde quando o Alto Vera Cruz ainda “era uma roça”, como nos lembrou a Menina Sueli.

E é na “roça” que o encontro se deu, reativando as memórias do chão. De maneira espontânea as Meninas vão lembrando o algodão, que lembra o óleo de mamona, que lembra azeite e o fio para o candeeiro e para lubrificar as juntas da roda e do tear. E o fio do algodão entrelaça as narrativas das Mulheres do Jequitinhonha Mila, Nêga, Marli, Dona Sena e Dona Nilza às lembranças de várias Meninas de Sinhá que também conheciam diversos usos do algodão. Dona Luiza, que já fiou e teceu, Gegê e Ercília, com seus algodoeiros, Seninha, cujo algodoeiro cuidou e cuida das mulheres da comunidade com chás, banhos, compressas e óleo. O cantar, as batidas do algodão, a musicalidade no cotidiano das Mulheres do Jequitinhonha e Cantadeiras de Sinhá lembrou que o corpo que dança e toca é o corpo que capina, tece, cozinha, estuda, benze e é benzido.

Cada semente traz em si o segredo da planta, das flores e dos frutos. Será que a semente do algodão traz consigo os segredos dos fios e das tramas do tecido? O certo é que quem se deita em uma rede de algodão revira lembranças de sua terra de origem e tece sonhos. Para as Meninas de Sinhá o algodão é um fio que as liga às longínquas origens. Para as mulheres do Jequitinhonha o algodão é o tecido de suas vidas. O Alto Vera Cruz é agora o tear que entrelaça a vida dessas mulheres, pelos fios de histórias, saberes, cantigas e alegrias.

                                                                     Letícia Bertelli

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